RETRATO COM MADONNA, SANTOS E CELEIRO você encontra
câmera na mão, abraça o sal do universo
a reproduz, a reescreve, desconstroi
o som da água quando o corpo se desespera
emas correm por tundra assombrosa
destruição de peitos, presenças fixas, perguntas
coisas óbvias, lugar exato, sentido, palavra limpa
folhas de joio, exaltada, uma voz pergunta
por que uma ema correria pela tundra se mal
sei o que é tundra, se mal imaginei a ema, se mal
sua imagem incompleta, seu traço de praga, esse
retrato que rompe este poema, a pequena hermenêutica
da plenitude difícil dos beijos, das fotografias
na parede de seu quarto, suas lembranças
cheias de ressonâncias mortas, o quê
que significa estar cheio
se há que quebrar tudo, o que significa o verdor
detrás de porta e nuvem de cigarros a dois centímetros do teto
desenhando um corpo, secando pele que sua
sombra do nosferatu, jovens britânicos
pub fantasma de Yorkshire, periferia maldita
possibilidade monstruosa, debruçada
no frontispício de um cinema que abandonamos
a fantasmas que nunca vieram a estas vilas, dentro
do ventre de uma batalha contra imagem afundada
em sofás baratos, tv technicolor, do lado da herança
a miséria de parente estrangeiro cuja caveira prende-se
ao zíper da calça enquanto a água golpeia
suas lembranças, dispersas, o tempo atípico
o leve simulacro de tradução que soa nas palavras
escrevo para você, animal intraduzível
quando em O brother where art thou brilha ajoelhado
esse mesmo menino, dentro da canção
dos três coveiros negros cavando chuva muito longe
longe
do lugar em que o encontra, redundante, inútil
bar alegre e piedade escura, insolação adolescente irritável
você lança
o laço, telefonema, tela plasma
a ele que não é valente, que não é bravo, que jamais
arruma coragem para embebedar-se e perder
o controle que resta da vida; vaso ao oceano
ou hipopótamo que fala de amor diante dum ataúde
já não sei, a vida, já não sei onde erguer
o garoto ensebado que às duas da tarde
acorda um domingo e pensa
no fundo ofendido desta cidade, nesta marcha
que exibe o espectro imantado
do meu cabelo água, cabelo luz, cabelo placidez municipal
nota fiscal incendiária que dança como o mar
como uma prancha de felicidade numa vila
que não fala bem
da felicidade
(tradução de Ricardo Domeneck)
original e fonte: http://revistamododeusar.blogspot.de/2014/01/wingston-gonzalez.html
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