domingo, 12 de abril de 2020

Medo, de Raymond Carver


Medo de ver um carro da polícia estacionar no passeio.
Medo de adormecer à noite.
Medo de não adormecer.
Medo de que o passado acorde.
Medo de que o presente levante voo.
Medo de que o telefone toque na calada da noite.
Medo de tempestades elétricas.
Medo da mulher da limpeza que tem uma mancha no rosto!
Medo dos cães que me asseveraram que não mordem.
Medo da ansiedade!
Medo de ter que identificar o corpo de um amigo morto.
Medo de ficar sem dinheiro.
Medo de ter muito e as pessoas não acreditarem nisso.
Medo de perfis psicológicos.
Medo de chegar atrasado e medo de chegar antes de toda a gente.
Medo da letra dos meus filhos em envelopes.
Medo de que eles morram antes de mim e que me vá sentir culpado.
Medo de ter que viver com a minha mãe na sua velhice e na minha.
Medo da confusão.
Medo de que este dia termine com uma nota infeliz.
Medo de acordar e descobrir que te foste embora.
Medo de não amar e medo de não amar o bastante.
Medo de que aquilo que amo se torne letal para aqueles que amo.
Medo da morte.
Medo de viver muito tempo.
Medo da morte.

Eu já disse isso.







Raymon Carver, USA (1938-1988)
Carver morreu aos 50 anos, vítima de cancro. A sua sepultura em Port Angeles (Washington), tem a seguinte inscrição:
“E conseguiste o que querias da vida, mesmo assim?”
“Consegui.”
“E o que querias?”
“Saber que sou amado, sentir-me amado aqui na terra.”

(Via Jorge Sousa Braga)

post de opoemaensinaacair

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