domingo, 7 de março de 2021

Cantares, de Antonio Machado

Tudo passa e tudo fica

porém o nosso é passar,

passar fazendo caminhos

caminhos sobre o mar


Nunca persegui a glória

nem deixar na memória

dos homens minha canção

eu amo os mundos sutis

leves e gentis,

como bolhas de sabão


Gosto de ver-los pintar-se

de sol e grená, voar

abaixo o céu azul, tremer

subitamente e quebrar-se…


Nunca persegui a glória


Caminhante, são tuas pegadas

o caminho e nada mais;

caminhante, não há caminho,

se faz caminho ao andar


Ao andar se faz caminho

e ao voltar a vista atrás

se vê a senda que nunca

se há de voltar a pisar


Caminhante não há caminho

senão há marcas no mar…


Faz algum tempo neste lugar

onde hoje os bosques se vestem de espinhos

se ouviu a voz de um poeta gritar

“Caminhante não há caminho,

se faz caminho ao andar”…


Golpe a golpe, verso a verso…


Morreu o poeta longe do lar

cobre-lhe o pó de um país vizinho.

Ao afastar-se lhe viram chorar

“Caminhante não há caminho,

se faz caminho ao andar…”


Golpe a golpe, verso a verso…


Quando o pintassilgo não pode cantar.

Quando o poeta é um peregrino.

Quando de nada nos serve rezar.

“Caminhante não há caminho,

se faz caminho ao andar…”


Golpe a golpe, verso a verso.


(Tradução de Maria Teresa Almeida Pina)

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